A principal surpresa da apresentação do novo iPad, nesta quarta-feira (2), não foi o aparelho, que ficou dentro das especulações da imprensa, mas a presença de Steve Jobs no evento. Muita gente acreditava que Jobs, afastado do seu cargo de diretor-executivo para tratamento médico, não iria ao lançamento do iPad 2, a segunda geração do aparelho da Apple que criou praticamente do zero um mercado bilionário para tablets no ano passado. Jobs não só apareceu por lá como, com seu tradicional jeans e camiseta preta, apresentou o evento. Ele subiu ao palco bem mais magro do que no fim de janeiro de 2010, quando mostrou ao mundo o primeiro iPad. A apresentação foi permeada por uma ideia: 2011 será o ano do iPad 2, como 2010 foi o do iPad. E o novo aparelho é exatamente o que era esperado: mais fino, mais leve, mais rápido, mas com o mesmo preço.
Em relação ao primeiro iPad, o novo modelo é 33% mais fino e tem a traseira arredondada, mas não é essa a comparação que assusta. A comparação que vale é: o iPad 2 é mais fino que um iPhone. Enquanto o iPhone 4, o mais novo modelo do smartphone da Apple, tem 9,3 milímetros de espessura, o iPad 2 tem apenas 8,8 milímetros. O novo tablet também é mais leve - pouco, 90 gramas, pesando 601 gramas na versão sem 3G - e bem mais rápido: o novo processador da Apple, o A5, deve dobrar a velocidade de processamento e aumentar em nove vezes a qualidade gráfica do dispositivo. O A5 é um processador dual-core, um tipo de chip que, embora comum em computadores, começa a chegar agora ao mundo móvel. Pode ser ou não o ano do iPad 2, mas 2011 também deve ser o ano dos smartphones com processadores dual-core. É muito provável que o iPhone 5 tenha um chip assim.
Uma das novidades mais esperadas são as câmeras. O primeiro iPad não tinha nenhuma. O novo tem duas, o que acaba com uma desvantagem óbvia do tablet da Apple. A câmara traseira tira fotos e grava vídeos em HD, o que é ótimo, mas câmera frontal talvez aumente mais a utilidade do aparelho: embora não filme em alta-definição como a outra, traz para o iPad a funcionalidade de videoconferência apresentada no iPhone 4. Por isso, claro, o aplicativo FaceTime, da própria Apple, também vai estar agora disponível para o tablet. Com o FaceTime, os usuários de iPad poderão realizar chamadas de vídeo para outros iPads ou iPhones 4 através de rede wi-fi (muitas operadoras bloqueiam o uso desse aplicativo nas redes 3G, por consumir muitos dados, e usar assim não seria uma boa ideia para quem não tem um plano ilimitado de dados). As câmeras também trazem para o iPad o Photo Booth, o famoso programa de fotos dos computadores da Apple, e devem tornar disponível para o tablet os milhares de aplicativos de foto disponíveis para iPhone - alguns deles geniais.
Outros programas naturais dos computadores da Apple que ganham versão para o iPad são o iMovie e o GarageBand. O primeiro é um aplicativo que tenta simplificar o trabalho de edição de vídeo para tornar a experiência mais fácil. O iMovie vai funcionar com até três faixas de áudio e vai ter recursos de compartilhamento para postar o vídeo diretamente em sites como YouTube, Facebook e Vimeo. O GarageBand é um aplicativo para criar e gravar música. O aplicativo para iPad grava até oito faixas por música, uma alternativa rápida e barata para bandas querendo gravar demos, e possuiu instrumentos digitais, como teclados, baterias e até um violão. Um versão do GarageBand para iPad é uma boa aposta da Apple, uma vez que o tablet já foi transformado em instrumento musical por centenas de usuários ao redor do mundo e tem sido encarado como um aparelho importante para o futuro da criação musical. Os dois apps vão custar US$ 4,99.
As novidades ainda incluem um giroscópio, uma nova versão do sistema operacional iOS com melhorias no navegador Safari e uma saída HDMI - que vai permitir que o usuário passe conteúdo de qualquer aplicativo (pense em streaming de filmes) para uma televisão de alta-definição com ajuda de um cabo que vai custar US$ 39 (deve chegar no Brasil custando mais de R$ 100). O iPad 2 também ganhou uma versão branca, algo que havia sido prometido sem sucesso para o iPhone 4. Os aparelhos também ganharam um nova capa protetora, o Smart Cover, uma cobertura que se cola ao iPad com uso de magnestismo e protege tela (além de colocar o iPad automaticamente em modo de espera). A tela continua com o mesmo tamanho (9,7 polegadas) e a resolução continua a mesma. Para quem esperava que o iPad 2 teria a super tela do iPhone 4 isso pode ser uma decepção, mas essa ausência pode ser explicada com facilidade: preço. Aumentar a tela do iPhone 4 para o tamanho da tela do iPad seria muito caro.
O que nos leva ao preço: o modelo mais barato - de 16GB, sem 3G - continua custando exatamente o mesmo: US$ 499 nos Estados Unidos. Os outros modelos sem 3G, só com wi-fi, vão custar US$ 599 (32GB) e US$ 699 (64GB). Para os modelos com as duas opções de conexão de dados, o preço aumenta em US$ 130 e os aparelhos saem por US$ 629 (16GB), US$ 729 (32GB) e US$ 829 (64GB). Ao contrário do primeiro iPad com 3G, que era vendido apenas pela operadora AT&T, o iPad 2 segue o caminho do iPhone e será comercializado também pela Verizon. Os aparelhos começam a ser vendidos nos EUA no dia 11 de março e chegam a diversos países da Europa no dia 25. Não há previsão de lançamento no Brasil.
O preço do iPad se tornou uma bandeira da Apple. Em sua apresentação, Jobs disse para quem “afirmou que o preço [do iPad] era irracional”: “pergunte agora aos nossos concorrentes se o preço é justo”. A segunda geração do iPad chega ao mundo sem que o tablet ainda tenha um concorrente de peso e o preço é talvez o principal responsável por isso. As concorrentes da Apple falharam até agora em um ponto crucial: conseguir desenvolver um aparelho mais barato que o iPad. Nos mercado americano, o Galaxy Tab, da Samsung, um tablet compacto com uma tela menor, custa US$ 550. O preço inicial do Motorola Xoom, que roda a nova versão para tablets do sistema operacional Android, do Google, é de US$ 799. O G-Slate, da LG, deve começar a ser vendido por US$ 699 e embora existam rumores de que o Playbook, da Blackberry, vai custar menos de US$ 500, não há nada concreto.
A Apple parece cada vez mais no caminho da dominação do mercado de tablets: uma demanda que a própria empresa criou com o iPad. De acordo com os números apresentados por Jobs, foram vendidos 15 milhões de iPads entre os meses de abril e dezembro de 2010, o que gerou um faturamento de US$ 9,5 bilhões. Jobs afirma que isso é mais do que todas as outras tablets já vendidas e que a Apple tem 90% do mercado desses aparelhos. De acordo com o site Digitimes, a Apple espera vender entre 6 milhões e 6,5 milhões de iPads no primeiro trimestre de 2011 e um total de 40 milhões no ano. Além do preço, o aparelho da Apple tem pelo menos outras duas vantagens. Primeiro, a força da marca, não só da Apple, mas do imaginário criado em torno do iPad: há quem use a palavra iPad em substituição ao termo tablet; segundo, os aplicativos. Somando os apps desenvolvidos só para iPad com aqueles disponíveis para o iPhone que também podem ser usados no tablet, o aparelho da Apple tem uma oferta de programas muito superior a qualquer um de seus concorrentes.
Em uma coisa Jobs parece estar certo: estamos entrando em um época de dispositivos “pós-PC”, aparelhos que precisam ser mais intuitivos e fáceis de usar e carregar do que os velhos computadores e laptops. Jobs afirmou que esses aparelhos “pós-PC” (o iPod, o iPhone e o iPad) são a principal fonte de faturamento da Apple. Não é novidade que o mercado de dispositivos móveis cresce rapidamente. Agora, se a Apple - ou o iPad - vai ser um protagonista desse futuro, ainda está para ser decidido. No mercado dos smartphones, os celulares com Android já se apresentam como uma potência mundial, acabando com uma certa hegemonia do iPhone. No mercado de tablets, por outro lado, a Apple ainda parece estar sozinha. É claro que não sabemos nem se os tablets vão fazer parte do futuro dos equipamentos eletrônicos: sua utilidade, até agora, parece depender bem mais dos usos e necessidades individuais do que a utilidade óbvia de um smartphone ou de um laptop. No mais, tablets parecem fazer, de um jeito um pouco diferente, o que é possível com um notebook e um celular. Resta esperar o que está para ser inventado, e a Apple parece disposta a investir nesses aparelhos.